A atenção é um componente essencial à aprendizagem, definida por Zorzi (2003) como “uma capacidade geral de estarmos receptivos ao que se passa no mundo, de modo a sermos capazes de, dentre um conjunto de fatos que nos chegam, selecionarmos alguns deles para que os compreendamos de um modo mais efetivo” (p. 151). Ela é ainda mais imprescindível nos dias atuais, em que crianças de centros urbanos estão sujeitas, na maior parte do tempo – inclusive em sala de aula –, a estímulos sensoriais e ambientais diversos que concorrem pela sua consideração. Ciasca et al (2007) relacionam-na à aprendizagem afirmando que “a atenção é necessária para a percepção do estímulo, a elaboração e a transformação deste em resposta” (p. 12). Se a aprendizagem for considerada uma mudança de comportamento gerada por um estímulo, é a atenção que tornará a mente capaz de (1) perceber o estímulo, (2) processar o estímulo, (3) transformá-lo em resposta/comportamento e, finalmente, (4) ser capaz de manter o comportamento aprendido, conforme a abordagem neuropsicológica. Segundo os mesmos autores, “as falhas específicas definidas por atraso na aquisição da atenção seletiva ocasionam dificuldades de memorização e organização do conhecimento.” (CIASCA et al, 2007, p. 12).
Considerada o “maestro da mente”, a atenção coordena o funcionamento da memória, da linguagem, das seções sequenciais e outras funções cognitivas, a fim de produzir o resultado desejado (LEVINE, 2003). Na opinião de educadores, esta tem sido uma das maiores dificuldades apresentadas pelas crianças em sala de aula: a capacidade de manter o foco nos conteúdos e atividades.
Essa percepção de educadores, geralmente relatada aos pais, tem gerado um aumento nas suspeitas de ocorrência do transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), as quais têm motivado de 30% a 50% dos atendimentos em saúde mental nos Estados Unidos (ANDRADE; SCHEUER, 2004). Entretanto, as consultas e os diagnósticos são, em determinadas situações, superiores ao índice de TDAH apontado por estudos, que afirmam estar ele presente em cerca de 5,29% da população mundial (COUTINHO et al, 2009).
O aumento no uso do metilfenidato, medicamento estimulante utilizado para minimizar os sintomas do transtorno, tem chamado a atenção de especialistas, visto que seu uso aumentou cerca de 700% nos Estados Unidos na década de 1990 e triplicou no Brasil entre 2001 e 2006 (CALIMAN, 2008). A compreensão do transtorno, que a princípio aliviou o fardo de crianças cujo insucesso escolar era até então atribuído à preguiça, desinteresse, falta de empenho ou de inteligência, corre o risco de cair em outro extremo, uma visão oposta da situação: a patologização, ou seja, a suposição precipitada de que toda e qualquer dificuldade apresentada no ambiente escolar constitui-se distúrbio. Alguns autores apontam para uma tendência atual de superdiagnosticar distúrbios de aprendizagem (THAPAR; THAPAR, 2003), entre eles o TDAH.
Por esse motivo, diante de uma criança desatenta, é importante diferenciar o TDAH, causado por razões orgânicas, da manifestação de desatenção, que pode ser causada por fatores ambientais. Antes de suspeitar de um transtorno, é importante analisar o ambiente no qual a criança está inserida assim como a existência, em sua rotina, de fatores causadores do problema.
Entre os fatores ambientais da desatenção, pode-se destacar o excesso de estímulos como um dos principais motivos. A comparação entre o ambiente no qual vivem os moradores de centros urbanos atuais com aquele no qual viviam nossos avós e bisavós torna claro o fato de que a sociedade atual é muito mais exposta a estímulos sensoriais. A exposição diária a sons, imagens, texturas, cheiros e outras sensações é tão grande que pode ser considerada um verdadeiro bombardeio mental.
O excesso de estímulos dificulta a assimilação do conteúdo escolar, que passa a representar apenas uma parcela mínima da quantidade de informações recebidas durante o dia. Além disso, diante de todos os recursos da mídia que as crianças de hoje visualizam, a aula, convenhamos, está entre as atividades menos interessantes.
Segundo Zorzi (2003), a superestimulação causada pelo excesso de sons e imagens competindo entre si (pessoas falando, TV ligada, rádio, ruídos da rua, objetos, poluição visual) exige um esforço muito grande dos processos nervosos para a seleção de estímulos. Uma criança exposta a essa competição de estímulos não pode ser rotulada como portadora de um problema de atenção. Ela é, na verdade, vítima de um ambiente desfavorável à concentração e à aprendizagem.
Ainda segundo Zorzi, a atitude familiar interfere na aquisição da capacidade de focar a atenção de forma seletiva por parte da criança. Como afirma o autor, a internalização das noções básicas do sim e do não ajudam-na a “controlar a hiperatividade natural que apresenta e no sentido de melhor dirigir a atenção” (2003, p. 155). Dessa forma, o estabelecimento de limites claros desde os primeiros anos, aplicados de forma firme, mas tranquila, contribui no sentido de ajudá-la a adaptar-se à realidade de um modo mais produtivo. Essa situação se estabelece conforme a criança é orientada, nas situações simples do cotidiano, quanto ao que pode ou não ser feito, o que pode ou não ser explorado, o que pode ou não ser manipulado.
Com relação à rotina seguida pela criança, alguns hábitos podem prejudicar a capacidade de atenção. A dificuldade de atenção pode ser ocasionada por diversos fatores, apontados em abundantes estudos, que a relacionam com distúrbios do sono (GONDIM, 2007), privação de sono por hábitos inadequados (MATHIAS et al, 2006), privação de alimentos nutritivos no período da manhã e antes das aulas, além de fatores emocionais e eventos estressantes, entre outros.
Conclui-se, portanto, que a apresentação de sintomas de desatenção em uma criança não pode, por si só, ser interpretada como um diagnóstico definitivo de TDAH. Toda a rotina do aluno precisa ser minuciosamente analisada a fim de se detectarem possíveis causas para essa situação. Persistindo a desatenção mesmo após a eliminação desses fatores, procede-se, então, à investigação da possibilidade do transtorno.